A FÉ DE UMA CRIANÇA - Por Vicente Almeida
Há mais de cento e quarenta anos, Várzea Alegre era apenas uma pequena vila de uns duzentos habitantes, perdida na imensidão de terras devolutas no sul do Ceará, onde só se chegava em lombo de animal ou a pé, e naqueles longínquos tempos havia grandes secas, de forma que os seus habitantes de tempos em tempos sofriam grandes privações.
Em um daqueles
períodos de seca, já havia uns quatro ou cinco anos sem chover, não sei ao
certo.
Um passarinho me contou a seguinte história.
Várzea Alegre possuía uma pequena capelinha, onde todos os domingos o padre Morais, sacerdote ali residente e único em uma extensa região fazia sua celebração dominical. A freqüência à pequena capela aos domingos era como em um dia de festa, a maioria dos habitantes se fazia presente.
O fervoroso sacerdote, vendo o sofrimento daquele povo e sem saber mais o que fazer, em virtude da grande seca, convidou a comunidade para em procissão, ir fazer uma prece lá no Vale do Machado, que era o lugar mais verde e fértil daquele vilarejo, mas agora estava esturricado.
Na sua homilia, o padre argumentava, que lá no Vale do Machado era um ótimo lugar para pedir a Deus, chuvas em abundância, e Deus vendo o Vale ressecado teria dó do sofrimento do povo, e mandaria a chuva.
Todo mundo cheio de fé, e acreditando na idéia do padre aceitou fazer a romaria, e foi nomeada uma comissão para organizar o evento.
A chefia da comissão foi entregue a Mundim do Vale, que convidou Sávio Pinheiro, Israel, Claudio Sousa, Magnólia, Didi Morais, D. Tonha, Giovani Costa, Francisco Gonçalves e Rolim para o auxiliarem na organização da grande romaria.
Era uma comissão muito grande por que todo mundo ansiava pela chuva, e acreditava que o padre Morais tinha razão, era preciso fazer alguma coisa diferente para chamar a atenção de Deus.
E no dia programado, às seis horas da manhã, já estavam todos na capelinha de São Raimundo Nonato. O Padre Morais foi o primeiro a chegar. O sol estava tinindo já naquelas horas, era o período invernoso... E nada de chuva.
O fato é que
todos observaram a chegada de um garoto de uns nove anos, chamado João Pedro, e
riram dele, pois, vinha todo agasalhado, um grande chapéu e ainda sob a
proteção de uma capa de chuva, improvisada por sua mãe Micaelli, por
insistência dele. Ela no princípio estranhou o pedido do menino, mas o pai
Menezes pediu que ela atendesse o filho.
O padre vendo aquela arrumação exclamou: Você está doido meu filho, você não vê que o sol já a esta hora, arde na pele da gente?
O João Pedro respondeu, mas padre estou muito gripado e se vamos pedir chuva a Deus, já imaginou quando estivermos voltando lá do Vale do Machado, todo encharcado? Vai ser aquele toró e preciso estar bem abrigado.
Mesmo assim é
loucura, não vê que tá todo mundo mangando de você? Olhe pro sol menino!
João Pedro disse: Mas padre, e nós não vamos buscar chuva? Insistia o garoto.
E lá se foi a grande procissão, todo mundo cantando, era uma longa viagem de uns quatro quilômetros, mas todos suportaram.
Em lá chegando
começaram a orar. Instantes depois, o céu foi se dobrando em véu, e nuvens
começaram a correr pelo azul celeste, escondendo o astro-rei. Em alguns
instantes escureceu.
Um pequeno e tímido trovão ressoou no Vale, e o primeiro pingo de chuva caiu na cabeça do Senhor José André, um senhor idoso e muito experiente e que por coincidência era o pai do padre Morais. Então ele arregalou os olhos e num misto de intensa alegria gritou: Ooolha a chuuuuva chegandooo aí geeente!
Ninguém tinha onde se esconder, pois o Vale do Machado, era um grande e descampado baixio, e a chuva começou a cair em intensidade, e escorrer por todo o Vale e por toda a Região.
O João Pedro,
vendo a correria do povo para se abrigar, nem ligou, só fez rir e interrogou:
Vocês vieram pedir chuva e não vieram preparados?
E os rios
transbordaram, e nos dias seguintes os pássaros se alegraram sem parar, e os
sapos entoaram seus cantos, e a natureza ficou em festa. E o brilho da alegria
retornou aos lares, e o contentamento das pessoas externava um permanente
agradecimento e louvor a Deus.
O inverno naquele dia começou, e a safra do ano e dos anos seguintes foi grandiosa, produziu tanto cereal que passou a ser conhecida como a terra do arroz.
**************************************************************
Você está pensando que foi a romaria que trouxe a chuva. Pois se enganou! Foi simplesmente a fé incontestável de uma criança de nove anos.
**************************************************************
História e
personagens fictícios, qualquer semelhança com fatos e pessoas, terá sido mera coincidência.
SERÁ???
Escrito
por Vicente Almeida
em 06/10/2011
Nenhum comentário:
Postar um comentário