OBRIGADO PELA VISITA

O LABORATÓRIO SIDERAL leva até você, somente POSTAGENS de cunho cultural e educativo, que trata do universo; das gentes; das lendas; das religiões e seus mitos, e de forma especial, dos grandes mistérios que envolvem nosso passado. Contém também muitos textos para sua meditação. Tarefa difícil, mas atraente. Neste Blog não há bloqueio para comentários sobre qualquer postagem.

A FOTO ACIMA É A VISÃO QUE TEMOS DO NOSSO INCANSÁVEL PICA PAU, ABUNDANTE AQUI NA MATA DA NOSSA "VILA ENCANTADA".

sábado, 4 de maio de 2013

A FORÇA DO AMOR - Por Vicente Almeida

O homem foi embarcado no trem que em seguida partiu. Horas depois atravessou a fronteira que limitava aquele país com o seu.

em solo pátrio, após percorrer algumas centenas de quilômetros, seu vagão foi completamente ocupado por algumas dezenas de universitários, que se destinavam aos seus lares, afim de passar férias com seus familiares.

Aquele homem aparentando uns sessenta anos de idade, pele queimada, olhar triste e perdido, cabeça baixa, sem articular uma só palavra com os presentes, não percebia o barulho infernal que faziam os estudantes,  nem si quer notava a presença deles.

Durante algumas horas ele se manteve introspectivo, como se olhasse apenas para dentro de si.

Estava tão absorto em seus pensamentos que nem ouvia o burburinho naquele vagão, apesar dos cantos e batuques entoados pelos estudantes.

Uma jovem de uns vinte e três anos, que sentava ao seu lado percebeu sua tristeza e tentou confortá-lo. 

Voltando-se para ele procurou dialogar. De princípio mal olhou para ela e voltou a adentrar-se. Isto despertou mais ainda o interesse dela, que passou a insistir para que ele também se alegrasse um pouco já que a viagem seria longa.

Dizia ela:

- Por que o senhor não se abre comigo? ainda temos oito horas de viagem e seria bom que trocássemos alguma ideia. O senhor com essa idade, certamente tem algo a me ensinar e se estiver com algum problema, quem sabe não possa eu ajudá-lo! Sou universitária e conheço muita gente.

Aquele homem que parecia um sessentão olhou firmemente nos olhos dela e ela percebeu quanto havia de tristeza naquele olhar e se interessou mais ainda pela sua possível história.

E ele acreditou na sua sinceridade dizendo: - É acho que a Senhora não vai mangar de mim...!

Fez uma longa pausa e finalmente disse...

... Tenho quarenta e dois anos, embora pareça muito mais velho!

Respirou fundo como a criar coragem e começou sua história;

- Fui prisioneiro de guerra no país vizinho durante vinte longos anos, você não poderia imaginar o que é isto. Fiquei incomunicável com meu povo e meu país, me senti abandonado, e esquecido,  nunca me permitiram escrever para lhes dizer onde estava, para falar das minhas saudades e amarguras e até mesmo demonstrar que não estava morto.

- Esta semana fui libertado e me permitiram que da prisão escrevesse uma carta para meus familiares e me prometeram postar no correio dizendo que chegaria antes de mim.

- Fiz aquela carta dias antes de me embarcarem neste trem e lhes entreguei, na esperança de cumprirem sua promessa. Não tenho bagagem, apenas a roupa do corpo e uma passagem até o final da linha.

- Zombaram de mim quando lhes falei que tinha um lar e família composta de mulher e dois filhos de menos de cinco anos.

- Pois bem; Estou voltando para casa...

... E a carta que escrevi era mais ou menos assim:

"Mulher, não morri, mas fui mantido prisioneiro por vinte anos. Esta semana fui libertado e estou voltando para casa, mas antes de me embarcarem autorizaram a lhe escrever esta carta. Possivelmente você terá contraído novo matrimônio, virou avó, mudou de endereço e poderá até ter me esquecido, pelo que não a culpo!

Mas na entrada da nossa cidade há uma longa curva e nela um frondoso Ipê. Caso ele ainda esteja lá e você não tenha me esquecido, peço-lhe que pendure um lenço branco no galho que aponta para a via férrea. Procurarei me sentar ao lado da janela para ver.

Se o lenço não estiver lá, não se preocupe passarei direto pela estação, não a incomodarei e nunca mais a cidade me verá".

Ao concluir sua história ergueu o olhar e percebeu que sua interlocutora estava soluçando e com lágrimas escorrendo pela face.

Ela então se levantou e baixinho foi conversar com seus colegas narrando o fato. Esses por sua vez, sensibilizados foram deixando seus assentos e percorrendo todo o trem composto de seis vagões conduzindo cerca de duzentos e cinquenta passageiros. Em cada vagão  passaram essa história para todos, depois retornaram aos seus lugares e emudeceram.

Dai para a frente, o tempo se tornou uma eternidade. Foi horrível, a angústia e a solidariedade haviam sido compartilhadas e  o silencio reinou absoluto durante horas, todos ansiosos aguardando a grande curva.

A longa jornada já durava dezoito horas, e eram quase dezessete horas quando o trem se aproximou da cidade onde ele havia morado e todos os passageiros lotaram as janelas do lado que se avistaria o Ipê.

Ninguém piscava, todos torciam para aquele homem. Queriam ver um lenço branco, mesmo que fosse bem pequenininho, pois ele significaria: "SIM! ESTAMOS A TUA ESPERA"

O trem apitou indicando a proximidade da curva que foi avistada a cerca de um quilômetro de distância...

... E o velho Ipê estava lá. De longe perceberam que toda sua copa estava branca, então julgaram ser a sua florada e se interrogavam, como poderemos ver um lenço branco perdido no meio de tantas flores?

SURPRESA! O maquinista também sabendo da história do seu passageiro, quanto mais se aproximava do Ipê, mas reduzia a velocidade do trem até quase parar, de forma que muitos saíram pelas portas laterais para ver a árvore que decidiria seu futuro.

... E viram, não um lenço branco, mas, dez..., cinquenta..., cem..., mil..., milhares, impossível contá-los. A copa do velho Ipê estava inteirinha branca quase escondendo toda a folhagem.

Impossível é descrever a emoção reinante naqueles passageiros, lágrimas e gritos de euforia explodiram de tal forma que poderíamos traduzir em um "OBRIGADO SENHOR".

Ao chegar na estação, sua mulher, seus filhos, netos e a cidade inteira estavam lá para recepcioná-lo.

Ele que não tinha bagagem desembarcou do trem e humildemente foi abraçar aquela gente com a sensação de haver renascido. Aquela viagem jamais será olvidada.

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Chegamos ao fim do nosso despretensioso conto. Este é o último parágrafo, não há mais tempo para descrever as festividades alusivas a recepção daquele passageiro ferroviário em sua terra natal, e como ficou sua vida, um, dois ou cinco anos depois, nem como alguns passageiros que constituíram a parte emocional da trama compreenderam a imensurável força do verdadeiro amor. Gostaria de falar sobre as copiosas lágrimas do velho maquinista, e a velha estação onde desceu o passageiro, nunca mais foram os mesmos. Agora é a vez do leitor. Visualize mentalmente as cenas e tire suas conclusões finais.
Escrito por Vicente Almeida
04/05/2013


Isto é ficção e qualquer semelhança com fatos ou pessoas terá sido mera coincidência.

6 comentários:

  1. É...

    Quando escrevo preciso sentir a emoção nas palavras que tento passar a você, por isto normalmente me ponho no lugar do leitor. Se não consegui lhe passar uma boa mensagem, mesmo assim valeu pela tentativa.

    Palavras amigas nem sempre vão direto ao coração, algum tempo poderá transcorrer até serem entendidas. Elas são como as sementes que somente germinarão quando o tempo se tornar propício.

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    1. Vicente, ando meio ocupada com uns cursos que invento de fazer e quase abandonei meu bloguezinho, mas eu acho e penso que a gente deve escrever sem se preocupar se vai agradar aos outros, temos que expressar os nossos sentimentos, nossas emoções, portanto, amigo, escreva!
      Um grande abraço a vocês!

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  2. Vicente, emacastro é meu local de trabalho. Quando vi havia postado o comentário por lá. Desculpe-me por tê-lo excluído.

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  3. É compadre, o compadre voltou e nem sabe o tamanho da emoção quando li este conto, E sei que há tempo para muito outros.Um abraço,em Julho vou aparecer por aí...

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  4. Vicente:

    Fui tomada por forte emoção. Quanto mais a visão passava pelas linhas mais expectativa surgia. Poxa! Quase não enxergava a árvore e muito menos o "LENÇO BRANCO".
    Uma linda "HISTÓRIA DE AMOR"!
    Um abraço:
    Fideralina.

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  5. É...

    ARTEMÍSIA:

    Quero escrever... Na verdade tenho muitos textos escritos, mas não publico antes de passar pelo meu crivo. Você entende né?

    Compadre LISBOA:

    É muito bom encontrá-lo por aqui de vez em quando. Que bom que você gostou da historinha.

    FIDERALINA:

    O nosso personagem esperava apenas um lencinho, mas encontrou milhares após vinte sofridos e longo anos, durante os quais sua esposa nunca perdeu as esperanças de revê-lo. Existe maior prova de amor? E a lição de vida que ficou?

    Neste conto fica caracterizado que a população da cidade, ao tomar conhecimento do regresso de um filho que julgava morto, se movimentou para amarrar nos galhos do ipê, os milhares de lenço.

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